Mitomania: a compulsão pelo ato de mentir

Publicado dia 25 de maio de 2021

Todos conhecemos a palavra “mito”, proveniente do latim e com origem grega, cujo significado está normalmente associado a narrativas fantasiosas, ficcionais, fabulares, alegóricas.

Dela deriva o termo “mitomania”, usado para nomear um problema psicológico que leva o indivíduo a sentir o impulso de mentir sem qualquer controle, e que não à toa é também chamado de “mentira obsessivo-compulsiva”.

Pessoas com o distúrbio chegam a perder a dimensão da realidade e tendem a misturar — não apenas nos relatos contados mas também em suas próprias mentes – fantasia e fatos da vida real. As estórias criadas incorporam-se à história pessoal.

Bem diferente da mentira do sociopata, a mentira obsessivo-compulsiva está muito mais associada à impulsividade do que a um comportamento planejado e calculista. É um vício em mentir, um comportamento compulsivo que não tem o objetivo de manipulação para obter vantagens. É um mentir sem nenhum ganho pessoal, guiado apenas pela necessidade de mentir.

E o mitômano não se incomoda com a possibilidade de ser desmascarado, não sentindo culpa ou vergonha por isso.

Fatores associados à mitomania

Não existe uma causa específica para a mitomania, e um conjunto de fatores associados costumam estar presentes, como baixa autoestima, necessidade de atenção e reconhecimento.

Mas mentir excessivamente também pode ser um sintoma comum de diversas doenças mentais, como nos casos de transtornos de personalidade borderline; sociopatia (transtorno de personalidade antissocial), transtorno de personalidade narcisista; transtorno opositivo-desafiador e transtorno de conduta — os quais são identificáveis já na infância e adolescência.

Por isso a importância de um diagnóstico diferencial. O diagnóstico da mitomania pode ser feito pelo médico psiquiatra ou psicoterapeuta após uma rigorosa avaliação.

O cérebro do mentiroso compulsivo

O cérebro humano contém uma massa cinzenta, onde se encontram os corpos celulares dos neurônios, combinada a uma substância branca, na qual estão localizados os axônios, que são prolongamento dos neurônios, fibras nervosas onde se realizam as sinapses. A substância branca é responsável por transportar sinais neurais de regiões subcorticais para o córtex, e vice-versa.

Os mitômanos apresentam um aumento de 23% a 36% de substância branca nas regiões orbitofrontal, médio e inferior. Este aumento da substância branca pode predispor algumas pessoas à mentira patológica.

O mitômano sabe que está mentindo?

O mitômano sabe que o que ele diz não é totalmente verdadeiro, embora não possua consciência plena da intenção de cada mentira.

Eles costumam iludir os outros com estórias mirabolantes na tentativa de suprir um vazio em suas vidas. E as estórias são sempre favoráveis a eles, claro.

Por exemplo, a pessoa pode se apresentar como sendo incrivelmente corajosa ou como amiga íntima de pessoas famosas e influentes.

A tendência à mentira não depende da situação imediata ou pressão social, mas representa uma característica inata da personalidade.

A mitomania é um distúrbio curável?

Os mitômanos raramente procuram ajuda por vontade própria.

É preciso que a pessoa consiga reconhecer os prejuízos que seu comportamento pode trazer para si e para os demais, e assim queira mudá-lo.

O tratamento geralmente envolve acompanhamento psicoterápico (a psicanálise é a melhor alternativa) e, no caso de pessoas que também apresentem outros quadros psiquiátricos, o tratamento medicamentoso pode ser recomendado.

O tratamento psicanalítico, entre outras coisas, objetiva trazer o indivíduo positivamente à realidade, ajudando-o a compreender o que está por trás dessa necessidade de mentir, trabalhando também a sua autoestima, valorizando sua história de vida, e reforçando seus relatos verdadeiros.

Se o ato de mentir pode trazer alívio para as lutas internas do indivíduo, a psicanálise é o melhor caminho para que o mitomaníaco encontre seu verdadeiro eu e aprenda a lidar com ele.

E dessa forma trabalha-se a extinção deste hábito disfuncional.

Quais as consequências de não se buscar tratamento? 

Ser um mentiroso compulsivo pode trazer várias consequências indesejáveis. Os relacionamentos, sejam amorosos, de amizade, familiares ou de trabalho, costumam ser conturbados e frequentemente destruídos, devido à falta de confiança que ele involuntariamente desperta no outros.

Se a doença avança, a mentira pode se tornar grave a ponto de eventualmente vir a causar problemas de ordem social, psicológica e até legal.

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