Jéssica Kuhn indica “A escavação”
Publicado dia 11 de março de 2021
i-PSIne 🎬:
“A escavação”
Nacionalidade: Reino Unido
Ano: 2021
Direção: Simon Stone
Gênero: Biografia, história, drama
Duração: 1:52
Plataforma: Netflix
Inspirado em uma história real e adaptado do livro homônimo de John Preston — cuja tia, Margaret Piggott, teve participação no evento — a trama de “A Escavação” se passa em 1939, às vésperas da Segunda Guerra Mundial e nos conta a impressionante história de um dos maiores tesouros arqueológicos da Europa!

Edith Pretty (Carey Mulligan) é uma viúva que mora com seu filho Robert (Archie Barnes) em uma mansão em Suffolk, na Inglaterra. Curiosa com alguns montes que fazem parte do seu grande terreno, ela chama Basil Brown (Ralph Fiennes), um arqueólogo amador para escavar suas terras. E juntos fazem a maior descoberta arqueológica do Reino Unido no século XX: a escavação de Sutton Hoo, que logo vira notícia nacional e interesse do Museu Britânico, de Londres – no qual os tesouros encontram-se atualmente em exposição. Também a propriedade de Sutton Hoo, no leste da Inglaterra, que conta com 255 acres e é hoje administrada pela National Trust, está aberta à visitação.
O filme é de uma refinada delicadeza e nos remete à metáfora arqueológica freudiana. Freud, o fundador da psicanálise, comparou o trabalho investigativo do psicanalista a aquele do arqueólogo. Para Freud, que admitiu ter lido “mais sobre arqueologia do que sobre psicologia”, tratava-se em ambos os casos de “escavar camada após camada”, o que ressalta o caráter “estratificado” da estrutura psíquica, para chegar “aos tesouros mais profundos e valiosos”.
O que importa nessa história não é a escavação em si, ou mesmo a justa homenagem a Edith Pretty e Basil Brown.
O filme trata da importância da descoberta de um patrimônio histórico ao mesmo tempo em que convive com a destruição iminente: o antagonismo entre mortalidade e legado. E novamente nós voltamos a Freud: pulsão de vida e de morte o tempo todo, entrelaçadas e pulsando como de fato se dá na vida real.
O roteiro primoroso de Moira Buffini (“O Último Vice-Rei”) apresenta como cada personagem enxerga o passado e encara a morte, especialmente em um ambiente de guerra, com o risco de um ataque aéreo a qualquer momento. E como as pessoas se relacionam nesse contexto.
Edith é a elegante e melancólica personagem que já viveu o luto do marido e que agora terá que enfrentar novamente a morte, sob outra perspectiva: escondendo de seu filho a sua grave doença e temendo pelo futuro dele.
E o que dizer da relação entre Basil (Ralph Fienes) e Edith (Carey Mulligan)? Uma interessante relação permeada por silêncios e indagações, baseada em respeito e admiração mútuos.
Basil não teve educação formal como arqueologista, embora entenda mais do assunto do que todos. Até 1944 a Inglaterra não garantia instrução pública até o ensino secundário para todos os seus cidadãos. Basil, talvez um dos melhores arqueólogos do país, vê-se menosprezado pelos detentores dos diplomas universitários e pelas cátedras.
Edith lida com a proximidade do fim enquanto ele luta por seu reconhecimento e entende a possibilidade de ter seu nome na história.
O roteiro consegue ainda abordar outros relacionamentos e seus respectivos conflitos, como o do casal Peggy (Lily James) e Stuart (Ben Chaplin), e também se abre para outros temas como preconceito, machismo, narcisismo e homossexualidade, numa Inglaterra da década de 40, ainda conservadora e estratificada em termos de cultura, educação pública e gênero.
“A Escavação” é um filme sobre como lidar com a vida mesmo em meio a tanta vulnerabilidade, correndo-se tantos riscos. Ao mesmo tempo que nos lembra de que nada é para sempre e nada se leva da vida, também nos alerta sobre como permanecemos vivos por meio do nosso maior tesouro após a morte: as nossas histórias para aqueles que ficam.
E assim, o filme também presta uma homenagem a pessoas que por anos ficaram apagadas da História.
E afinal, o que se leva da vida? Você já se perguntou sobre isso? Qual será o seu legado? O que deixaremos para as próximas gerações? Que tipo de memória queremos deixar para aqueles que amamos?
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Lisa