O fumo – um suspiro camuflado
Publicado dia 6 de abril de 2021
Jéssica Kuhn
O ato de fumar, em si, não é exatamente um prazer: o cheiro do tabaco é forte, persistente e incomoda. Tragar provoca ardência e sensação de sufocamento. Ainda assim, muitas pessoas adquirem o hábito e têm dificuldade de deixá-lo.
A nicotina é o alcaloide responsável por provocar a dependência. Depois de inalada, a nicotina leva aproximadamente dez segundos para chegar ao cérebro. Lá, ela estimula a produção de dopamina, mas a longo prazo passa a provocar a liberação de uma quantidade cada vez menor, saciando menos. Resultado: a pessoa irá precisar de doses cada vez maiores para que a nicotina produza os mesmos efeitos de antes.
Por que as pessoas fumam?
Puxar, inspirar, expirar… No hábito de fumar há a participação de vários e poderosos fatores psicológicos, além de um forte componente psicossocial. Vamos compreendê-los um pouco melhor.
* Psicossocial:
Para entender esse fator, basta observarmos os adolescentes. É comum que os adolescentes fumem apenas na presença de outras pessoas e que não mantenham esse hábito quando estão sozinhos. Desafiar o mundo adulto ou ambientes restritivos, pertencer a um círculo social, querer imitar pessoas que fumam e são admiradas, demonstrar que não é mais criança, reafirmar a independência… esses são alguns dos principais motivos que levam o jovem a fumar (e o adulto também!).
* Fatores inconscientes:
São vários os aspectos inconscientes que estão presentes no ato de fumar. Na psicanálise, fala-se sobre o vício do cigarro como a expressão de um sintoma oral. Representaria uma regressão à fase infantil da vida. Quando estamos inseguros, em crise, amedrontados ou ansiosos, regredimos a fases anteriores, infantis e queremos o colo e a mão da nossa mãe, o seu aconchego…
Por isso, fumar é um hábito característico de muitas pessoas que tiveram uma mãe superprotetora, que acalmava a criança dando algo para ela comer.
* Expressão de angústia
Já dizia o poeta Mário Quintana: “fumar é uma forma disfarçada de suspirar” .
Muitas pessoas dizem que sentem vontade de fumar quando estão angustiadas.
O tabaco funciona como um ansiolítico. Se não sabemos o que falta, deve ser o cigarro. Ao fumar, sentimos que era isto mesmo, e se novamente a angústia vier, o alívio está facilmente ao alcance da mão.
* Resposta à frustração
Alguns autores sugerem que, ao puxar a fumaça, literalmente, o que as pessoas fazem é tragar suas aspirações. Nesse sentido, fumar seria uma resposta à frustração. Simbolicamente contribui para inibir desejos.
* Tentativa de inspiração
Nessa mesma linha, afirmou-se que o que se busca com o hábito de fumar, simbolicamente, é inspiração. A falta de ideias, ou de recursos, para solucionar uma situação, inconscientemente, leva ao ato de fumar. É um ato que representa o desejo de se inspirar, sem, entretanto, obter sucesso.
* Vida e morte (pulsão)
O cigarro é vida e morte ao mesmo tempo. Fumar libidiniza a respiração. Pausada e prolongada, essa respiração pode adquirir uma característica de sensualidade, ela se torna um objeto de prazer, não uma função fisiológica. A fumaça torna o ar visível, enche-o de cheiro, conscientiza o ato de respirar. “Se fumo, estou vivendo”…
Mas também o cigarro é morte, todos sabem de seus malefícios à saúde. E a sensação também pode ser a de que a cada tragada é retirado um pouco do tempo de vida que nos resta, como se estivéssemos no controle do tempo da nossa existência e arranjássemos uma forma prazerosa de liquidar com ele.
O assunto é complexo, fatores comportamentais e emocionais estão diretamente implicados na construção da dependência.
Recuperando o fôlego
A psicanálise é a psicoterapia que poderá ajudar você a deixar esse hábito tão nocivo à sua saúde. Afinal, está comprovado que quando as motivações psicológicas para fumar desaparecem, o vício de nicotina é vencido com relativa facilidade.
Parar de fumar é um “processo” que exige coragem para iniciar e serenidade para respeitar cada fase a ser percorrida. Contar com a ajuda de um profissional pode tornar este caminho mais seguro e, quem sabe, mais suave.
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